25.3.07




Bento XVI não escreveu "O divórcio é uma praga"

domingo 18 de março de 2007

Um cochilo, ou o cansaço do tradutor, levou-o a confundir uma palavra italiana com uma semelhante em português. A palavra portuguesa "praga" em italiano se diz: "peste". E "piaga" em italiano significa "CHAGA" em português!

Teve grande repercussão nos meios de comunicação em nosso país, o termo "praga" que teria sido usado por Bento XVI, em sua Exortação Apostólica Pós-Sinodal: "Sacramentum Caritatis", referindo-se com ele ao divórcio e, de certa forma, magoando os corações daqueles que vivem um
divórcio.

Todos os que constituem uma família, o fazem na esperança da construção de um sonho e projeto de vida com uma pessoa de sua atenta, criteriosa e dedicada escolha. Mas sabemos que cada pessoa é um mistério. Só o tempo e a convivência nos permitem um conhecimento verdadeiro e mais profundo daqueles que amamos.

E, por mais criteriosa que tenha sido tal escolha, não são poucos os que, entre lágrimas de decepção e de dor, vêem cair por terra as esperanças de uma vida feliz no casamento. Em toda separação matrimonial, há um mais inocente que o outro. E toda e qualquer separação, ainda que, inicialmente eufórica por um dos parceiros no amor, ela carrega o amargor da decepção, da
dor e da frustração. Em meus 38 anos de sacerdócio, todos eles sempre muito perto de tantos e tantos casais, testemunhei o cair de lágrimas amargas dos olhos daqueles que se viram compelidos a uma separação matrimonial. Sofre o casal, sofrem as famílias envolvidas, sofrem muito mais os filhos. Aprendi que: "a caneta que assina o divórcio tem como tinta a lágrima dos filhos!" Ainda que na separação matrimonial se busque uma situação melhor de vida emocional, permanece a dor da frustração de um primeiro amor não correspondido.

Bento XVI, ao longo de toda sua vida de serviço à Igreja, soube se manter bem perto das pessoas, nas suas alegrias e nos seus sofrimentos. Ele nasceu de uma família. Nenhuma família vive isolada do mundo, das pessoas, do povo em geral. Ele testemunhou, seguramente, também, as dores e lágrimas de seus amigos que se viram constrangidos a uma separação.

Suas palavras, nessa Exortação Apostólica, retratam com cores bem vivas o quanto o divórcio significa de sofrimento para o casal e para suas famílias.

Ele usa a palavra "CHAGA", para significar tanta dor. O dicionário Aurélio assim define chaga: "ferida aberta; cicatriz deixada por essa ferida". O dicionário Houaiss usa quase as mesmas expressões: "ferida aberta, supurada; marca provocada por essa ferida".

Li o texto em sua versão oficial, em italiano, que cito, em breve. O texto italiano usa a palavra "CHAGA"! Vejamos, antes, o texto correto:

"Por isso, é mais que justificada a atenção pastoral que o Sínodo reservou às dolorosas situações em que se encontram não poucos fiéis que, depois de ter celebrado o sacramento do Matrimônio, se divorciaram e contraíram novas núpcias. Trata-se dum problema pastoral espinhoso e complexo, uma verdadeira chaga do ambiente social contemporâneo que vai progressivamente corroendo os próprios ambientes católicos. Os pastores, por amor da verdade, são obrigados a discernir bem as diferentes situações, para ajudar espiritualmente e de modo adequado os fiéis implicados".

Cito o texto oficial em italiano, na frase específica: "Si tratta di un problema pastorale spinoso e complesso, uma vera PIAGA dell`odierno contesto sociale che intacca in missura crescente gli stessi ambienti cattolici".

O Papa tem muito carinho e afeto com todos aqueles que vivem em situação de divórcio e pede aos Bispos e Sacerdotes que "procurem ajudar de modo adequado os fiéis".

Infelizmente, o estrago de um erro grave de tradução já está feito em nosso Brasil que se prepara para acolher o Santo Padre o Papa Bento XVI.

Agradeço a todos os sites, jornais e periódicos católicos, Diocesanos e Paroquiais que reproduzirem a publicação deste artigo, para que se desfaça, ao menos entre nós católicos o mal-entendido lançado por uma tradução incorreta.

Dom João Bosco Oliver de Faria
Bispo de Patos de Minas (MG)

(Agradeço a Lia Wyler)

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