1.5.07




Dubladores em guerra contra a Disney

Dubladores em guerra contra a Disney

Ministério Público do Trabalho dá parecer favorável a associação e abre investigação

(O Globo, 19/4/2007)

André Miranda

De um lado, o maior estúdio de animação do mundo. Do outro, uma associação que representa 400 profissionais no Brasil.
Corre na Justiça um processo movido pela Associação Nacional dos Artistas de Dublagem (Anad) contra a divisão brasileira da The Walt Disney Company.
A alegação da Anad é de que a Disney não pagaria os direitos devidos e que coagiria os dubladores a assinarem contratos com irregularidades. Em vista disso, o Ministério Público do Trabalho já se manifestou com um parecer favorável à associação e abriu um procedimento para investigar a relação trabalhista de todas as distribuidoras brasileiras com os dubladores.
O estopim para o processo da Anad foram dois contratos que a Disney firmou com o estúdio de dublagem Delart, do Rio de Janeiro, pelos filmes “Bambi II” e “Os Incríveis”. Neles, a Disney exige a cessão total dos direitos de todos os profissionais envolvidos na dublagem para a companhia, uma prática que a legislação trabalhista brasileira proíbe.
O contrato autoriza, ainda, a Disney a ceder os direitos dos dubladores para terceiros. Diz o texto: “Concordo pelo presente instrumento expressamente com todos e quaisquer usos que possam ser feitos dos direitos acima mencionados através de Disney Enterprises, Inc., ou terceiros autorizados, havendo ou não remuneração”.

Dublagens são usadas para todas as mídias

A Delart também assinou um contrato de prestação de serviços com os dubladores em que pede a cessão de direitos. Num desses, firmado em 1ode outubro de 2006 e anexado ao processo, admite-se a irregularidade: “... a empresa DCVI (Disney) e o Estúdio (Delart) reconhecem que, por ocasião da assinatura deste instrumento, as leis trabalhistas brasileiras proibiam a indução da assinatura de documentos de cessão de direitos para atores de dublagem como requerido acima”.
— Estamos investigando a relação entre distribuidoras, estúdios de dublagem e os artistas.
Queremos, num segundo momento, marcar uma audiência coletiva com todos, mas já podemos dizer que há irregularidades.
O que muitos dubladores contam é que eles são coagidos a assinar os contratos pela falta de opções no mercado — explica a procuradora do Trabalho Luciana Tostes.
A dublagem é considerada pela legislação brasileira um direito conexo, por ser anexo a criações intelectuais. Sua proteção também está prevista na Lei 9.610, de 1998, que trata dos direitos autorais. De acordo com a lei, artistas intérpretes devem autorizar e receber pagamento por cada mídia para a qual seu trabalho for reproduzido.
A prática, porém, segundo Sumára Louise, presidente da Anad, é bem diferente. Ela explica que as distribuidoras se utilizam de uma dublagem feita para o cinema, por exemplo, na produção de DVDs ou na veiculação de filmes na TV e até em aviões, sem pagar nada a mais para os artistas. A própria Sumára, depois de 34 anos de profissão e famosa por representar a voz de Meryl Streep e da atriz Cybill Shepherd em “A gata e o rato”, garante que nunca recebeu um centavo pela reprodução de seu trabalho em DVDs.
— Batalha-se
tanto contra a pirataria, e o que eles fazem é piratear a voz dos dubladores sem autorização. Praticamente todas as distribuidoras fazem isso, não é só a Disney — diz ela. — E, quando reclamamos, elas contratam brasileiros morando fora do país para fazer a dublagem.
Daí, surgem trabalhos de péssima qualidade.
Algumas distribuidoras, como a Imagem e a Fox, fecharam acordos com a Anad para o pagamento dos direitos conexos. A associação chegou até a entrar na Justiça com um processo contra a Fox, mas a ação foi removida depois que um protocolo de intenções foi assinado entre as duas partes.
— Não pagávamos direitos para outras mídias porque os estúdios de dublagem não aceitavam assinar contratos. Assim, entendíamos que estávamos negociando um serviço completo para qualquer mídia — explica Elie Wahba, vice-presidente da divisão de televisão da FOX do Brasil. — O que ocorreu agora foi que os dubladores entraram com uma ação sem conversar com a gente. Quando soubemos, entramos em contato e concordamos em pagar um acréscimo caso a dublagem fosse reproduzida em outro lugar.
Já a Disney afirmou, em nota, que “aguarda o resultado final da investigação”. A distribuidora explicou ainda que seu “posicionamento será colocado em audiência, tão logo a empresa for requisitada pelo Ministério Público do Trabalho do Rio”.
Procurado pelo GLOBO, Sérgio de la Riva, um dos sócios da Delart, não retornou as ligações.

Ator pode ter ganhado R$ 100 mil por voz em animação

Um artista de dublagem ganha cerca de R$ 70 por hora. No caso do dublador representar o protagonista, são necessárias, em média, seis horas para se realizar o trabalho. Em algumas produções, os 400 profissionais que atuam no país precisam concorrer com a voz de atores famosos de televisão, que eventualmente são contratados pelas distribuidoras. Fala-se no mercado que um ator de TV recebeu recentemente R$ 100 mil para trabalhar numa animação.
Outro problema é que nem todos os DVDs trazem a opção de dublagem em português.
Marco Antonio Costa
, dublador que representa a voz de George Clooney e associado à Anad, lembra que comprou há poucos dias um DVD com dublagens em francês e espanhol, mas sem versão em português.
— Além
de tudo, temos que enfrentar a força do mercado.
Eu e minha mulher (Lina Rossana, que faz a voz da Olivia Palito) dublávamos a série “Desperate housewives”, para a Delart.
Mas, dias depois de a Anad entrar com a ação, nos ligaram dizendo que o cliente havia pedido para nos trocar. Acabamos sabendo que eles falaram para outros dubladores que, se não saíssem da Anad, estariam fora da série — lamenta Costa.

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2 Comments:

Blogger Nanael Soubaim said...

Estou divulgando.

13:04  
Blogger JPS said...

Por que resolveu divulgar uma notícia de 4 anos atrás? Não entendi.

21:51  

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