20.11.11




Curso de Tradução em Gotas I

Inicio hoje uma seção especial do blogue:
Curso de tradução em gotas

Na primeira gota vou falar de "as pessoas". 
O negócio é o seguinte: "as pessoas" enchem a paciência. 
Enchem os textos de "as pessoas" por pura falta de conhecimentos da gramática da língua portuguesa e, por conseguinte, da inglesa também.
Prestem atenção, diletos pupilos: em inglês não existe sujeito indeterminado. Vocês sabem o que é isso? Não sabem? Então pesquisem, ora bolas! Pesquisar e aprender não faz mal à saúde. E, como diz o meu amigo Paulo Cintura, "saúde é o que interessa, o resto não tem pressa!" Issaaaa!

Vou dar uma dica: quando alguém diz "tocaram a campainha" está usando o sujeito indeterminado. Quem tocou? Sei lá! 
A língua inglesa é obrigada a recorrer a gambiarras: "The bell was rung", "Somebody rang the bell" etc. etc. Como deu para perceber, sempre tem um sujeito, mesmo que o sujeito seja "somebody". Aí a gente diz pro angloparlante, perdeu, playboy! Em português a gente não precisa inventar um sujeito, é só usar o sujeito indeterminado, muito mais bonito, cheiroso e elegante: Tocaram a campainha! Uh-hu!

Em inglês, todas as orações precisam desesperada e imprescindivelmente de um sujeito. 
É um tal de "people think I'm stupid", "people didn't understand what you said" etc. 

Já ouviram falar da Navalha de Ockham? É o princípio da parcimônia: se puder fazer com menos, não faça com mais. 

Na língua portuguesa, a navalha funciona assim:
Em inglês se diz: People think I am stupid.
O tradutor despreparado sente vontade de traduzir assim:
As pessoas pensam que sou burro. 
Bem, pois é, né? Se ficar enchendo os textos de "as pessoas" pra cá, "as pessoas" pra lá, vão pensar que é burro mesmo.
Vamos dar uma navalhada de Ockham? 
Pensam que sou burro.  
Ou, se quiser, Estão pensando que sou burro.
Agora me responda aqui no pé do ouvido: "As pessoas" estão fazendo falta? 
Nenhuma! O sujeito indeterminado é uma maravilha! Não existe no inglês, mas, e daí? O inglês também tem tanta coisa que não existe no português! 

Criançada, use com abundância a Navalha de Ockham! O seu texto ficará muito mais agradável, elegante, bonito, gostoso de ler! 
Esse papo de "as pessoas" é coisa de quem sofre de tin ear syndrome, mas isso tem cura! E o melhor é que nem precisa de medicamentos, basta ler e estudar bastante. 

E a música de hoje tem mais um toque: em um número muito grande de casos, quando é preciso manter o sujeito "people" na tradução, rogo, imploro, peço encarecidamente que usem "gente". Ouçamos esta música consagrada da Barbra Streisande: People. Diz a letra "people who need people". Se fôssemos traduzir, "pessoas que precisam de pessoas" ficaria um horror, concorda? Então vamos de "gente precisa de gente". Ô coisa linda, vocês não acham? Agora vamos ouvir a deusa cantar?




People,

People who need people,

Are the luckiest people in the world
We're children, needing other children
And yet letting a grown-up pride
Hide all the need inside
Acting more like children than children
Lovers are very special people
They're the luckiest people in the world
With one person one very special person
A feeling deep in your soul
[- From :http://www.elyrics.net/read/b/barbra-streisand-lyrics/people-lyrics.html -]
Says you were half now you're whole
No more hunger and thirst
But first be a person who needs people
People who need people
Are the luckiest people in the world
With one person one very special person
No more hunger and thirst
But first be a person who needs people
People who need people
Are the luckiest people in the world...




Até a próxima, gente! (Ou será que vocês preferem "Até a próxima, pessoas!"? Eca!

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24.5.11




O portinglês

Do Carlos Brickman, na edição de hoje do Observatório da Imprensa:

O portinglês
Winston Churchill, primeiro-ministro britânico na Segunda Guerra Mundial, conta no magnífico Minha Mocidade que, ao entrar na escola de elite em que o haviam matriculado, o professor quis ensinar-lhe a declinação da palavra latina "mensa" - mesa. O vocativo, explicou-lhe o mestre, seria usado se conversasse com uma mesa. O menino Churchill disse-lhe que não pretendia jamais conversar com uma mesa. Na discussão que se seguiu, Churchill acabou deixando a escola. E tomou uma decisão: não se dedicaria aos estudos de latim, nem de grego. Mas iria aperfeiçoar-se em sua língua, o inglês. E como se aperfeiçoou!
Bom, hoje vemos anúncios pedindo jornalistas com pós-graduação, domínio de duas ou três línguas, vivência internacional, e tudo por um salário que não paga nem os cursos. Funciona? Às vezes, funciona. Às vezes, dá coisas desse tipo:
1. "Oficiais da Federação Paulista de Futebol mostram total confiança (...)"
Official, em inglês, é alto funcionário. Em português, tem um monte de significados. E nenhum deles é o utilizado no texto.
2. (O jogador) "foi introduzido à torcida (...)"
Introduced, em inglês, significa "apresentado". "Introduzido" é outra coisa, mas deixa pra lá.

(a ilustração foi idéia minha)



E a música de hoje é o hino do Framengo em ingrêis
Deve ser da autoria de quem fez as traduções citadas acima. 




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16.8.08




Anglicismo Semântico du Jour

Vamos apostar quanto tempo leva para que a nossa velha conhecida cama elástica passe a se chamar trampolim?

Quem dá mais?

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2.2.08




O Maldito "por" - E a saga continua

Agora os nossos queridos colonizadinhos da editora Abril resolveram enfiar um "por" antes do nome do autor até na capa! O fenômeno extrapolou o decalque do by proveniente da matriz e agora virou um Frankenstein, à solta pelaí, fazendo estragos por onde passa.

Esta semana vi, numa banca de jornais, um Dicionário ilustrado do carro, com 1318 verbetes anunciados na capa. Distraída, fui logo comprando, pois nunca se sabe quando será necessário consultar um dicionário desses. Quando cheguei em casa com o livro na mão, contente por ter um dicionário cujos verbetes vão de abafador a zona de deformação, olhando melhor para a capa, percebi o maldito por antes do nome do Bob Sharp. Por quê? Alguém explica? É claro que os meus leitores queridos têm dicionários em casa, não têm? Algum deles tem por antes do nome do autor?

O pior é que nem me lembro mais onde comprei, só sei que foi numa banca de jornais, mas pode ter sido em qualquer lugar, então não posso devolver e pedir o meu dinheiro de volta.

Dirão meus leitores que isso é um detalhezinho muito minúsculo para invalidar um dicionário tão útil. Sei não, sei não. Quem toma atitudes simiescas logo na capa deve fazer muitos estragos por dentro. Tá, vou abrir uma concessão: para quem não sabe qual é a diferença entre amortecedor e pára-choque, para quem nem imagina o que seja aerofólio, o bichinho até que deve ter lá a sua utilidade.

Mas, cuidado, leitores! Sempre com um pé atrás! Não se deve confiar num autor que mete um por antes do próprio nome. Como eu disse lá em cima, a coisa já extrapolou a mera macaquice, pois os livros de autores anglos não usam o by antes do nome do autor na capa nem na página de rosto! Essa praga de gafanhotos já ganhou vida própria, que nem o gerundismo, que hoje é muito mais amplo e irrestrito do que a mera macaquice do future substitute. No início era fácil descobrir a origem do gerundismo, mas agora a coisa já se infiltrou em todos os setores da vida brasileira (e quiçá lusitana) e - traço característico do brasileiro - virou a malandragem preferida de quem não leva a sério os compromissos assumidos com os clientes, sejam estes consumidores ou eleitores. Não é de admirar, portanto, que a macaquice do por tenha atingido níveis jamais praticados pelos macaqueados, pobres angloparlantes.

Ah, num creu neu? Então visitem uma livraria (real ou virtual, tanto faz) e confiram vocês mesmos as capas dos livros importados que encontrarem. Procurem a coqueluche da década, por exemplo, o Harry Potter. Dou um doce pra quem encontrar um "by J. K. Rowling" na capa!

- Ah, mas o livro que você está comentando é dicionário, não é romance - dirão.

Ótimo, então procurem dicionários na livraria. Quando encontrarem um por na capa, será assim: organizado por, compilado por etc. O por sozinho não quer dizer absolutamente nada! A alegação de elipse é a mais descabida! Elipse de quê? De um verbo na passiva? Excelente! Mas qual verbo?

- É óbvio que o verbo é "escrito" - dirão.

Ah, tá. Quero ver provar! Se fosse possível haver essa tal elipse, ela seria de qualquer um dos que usei acima "organizado", "compilado", e também poderia ser elipse de "roubado", "plagiado", "sacaneado", "vilipendiado". O cara que tascou o por na capa pode estar morrendo de rir ao ver que vendeu um livro plagiado por ele, mas os leitores brasileiros, que só sabem usar pronomes ingleses, compram, felizes da vida, achando que o livro foi "escrito" pelo meliante.

Vou parar por aqui porque o Bruce Lee está exigindo que eu volte ao trabalho. Bom carnaval para vocês e muito obrigada por prestigiarem o meu blog. Até de repente!

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21.12.07




Decalcomania du Jour - ou O Maldito "por" Parte III

É interessante essa mania que o ser humano tem de copiar erros por acreditar que não sejam erros, só porque foram usados por gente de certo renome.

Quem acompanha as listas de tradutores na internet como eu, desde 1995, se tiver boa memória e for uma pessoa observadora, perceberá que, ainda na década de 1990, praticamente todos os tradutores usavam a preposição correta para atribuir autoria: de.

O maldito "por" antes do nome do autor anda se espalhando ultimamente que nem praga de gafanhoto e me surpreende perceber tradutores que não o usavam e até diziam que não se deixariam contaminar por tamanho despropósito lingüístico estarem hoje usando esse maldito "por" a torto e a direito.

Quando questionados, alguns se ofendem e afirmam categoricamente que sempre usaram esse maldito por e que isso sempre foi assim. Como dizem os anglos: Big Brother at his best! Oh, well. Não citarei nomes, é claro, noblesse oblige.

É doloroso ler em textos de pessoas que se declaram mestres e doutores o maldito "por" antes do nome do autor de livros, de palestras, de cursos etc. etc. etc. Que belo exemplo dão aos alunos!

E, com isso, agora está se tornando comum essa macaquice nos textos escritos por tradutores, que, cada vez mais, se aproximam dos textos produzidos por máquinas de tradução. A profecia do Josh Wallace, "translate beautifully or be replaced by a machine" (lantra, 1997) se realiza com mais força dia após dia. É lastimável.

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2.12.07




Decalcomania Du Jour

Tenho visto por aí a mania generalizada de fazer decalque do inglês em coisas que, em português, ficam com o signifcado oposto ao que teriam se em inglês estivessem.
Os neurônios dos brasileiros que fazem isso já foram devorados pelas leituras de inglês e de decalques.
Exemplo: Eu não poderia concordar mais. Em português, isso SEMPRE quis dizer que a pessoa um dia concordou e agora parou de concordar em razão de algum impedimento. Os autores dessas frases em português pretendem fazer decalque do inglês I couldn't agree more, mas pouco sabem tanto de inglês quanto de português. Caso soubessem, fariam a devida modificação que transformasse o I couldn't agree more em frase de teor semelhante em português. Em geral, o lusófono que não fosse decalcomaníaco, diria Concordo plenamente ou frases parecidas, de acordo com a tradição e a índole do vernáculo.

Cuidado com o decalque irrefletido, minha gente!

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7.11.07




Já salvou uma palavra hoje?

Quando era criança conheci muitos escoteiros, lobinhos, fadinhas etc. Não sei onde foram parar, pois nenhuma das crianças que conheço hoje em dia sabe o que é escotismo. Por que me lembrei dos escoteiros? Porque eles me contavam que tinham a obrigação de fazer pelo menos uma boa ação por dia. Essa idéia me remete à nossa língua. E se a gente fizesse pelo menos uma boa ação por dia com relação à língua portuguesa? Garanto que poderíamos ressuscitar um monte de palavras que correm risco de extinção.

A inexistência de ensino da língua portuguesa nas escolas já produziu algumas gerações de jornalistas e escritores analfabetos funcionais. Parece paradoxal afirmar que jornalistas e escritores são analfabetos funcionais, mas é isso mesmo, foi nisso que se tornaram, o amado leitor e a estimada leitora não entenderam mal.

À inexistência de ensino do português nas escolas se soma a imersão no inglês ainda em tenra idade. O primeiro contato que os jovens têm com as regras gramaticais, sintáticas e estilísticas acontece nas aulas de inglês. É preciso aprender inglês para poder trabalhar, mas o jovem só aprende inglês, ignora o vernáculo. E o pior dessa situação é que a maioria só pensa que aprendeu inglês, pois o que acredita saber é aquilo que nos outros países denominam Brazilian English com enorme desdém. Foi essa turma que acredita saber o que não sabe que inventou a expressão no break para denominar um aparelho que, lá na matriz, se chama UPS - Uninterruptible Power Supply. Experimente usar a expressão no break em conversa com angloparlantes que não saibam português. O interlocutor não vai entender nada!

É nesse ambiente que se cria a nova geração de tradutores do Brasil. Desconhecem as regras do português - na verdade, desprezam-nas, pois só tem valor o que está in English - e acreditam saber inglês - mas isso não passa de fantasia. Aprendem nos cursinhos de inglês que o chique é não usar dicionário pra nada e acabam cimentando achismos. Por exemplo, essa turma acha que a única tradução possível de The book is on the table é O livro está sobre a mesa. É muito mais idiomático dizer que o livro está na mesa ou, melhor, em cima da mesa, mas ensinaram a essa turminha que on é sobre, então tá, né? Ensinaram que find é achar, então ninguém imagina que também pode ser procurar. Quando se diz go find my shirt, em português costumamos dizer vá procurar minha camisa, mas a turminha do the book is on the table vai de vá achar minha camisa, como já ouvi e li trocentas vezes em filmes e livros. É duro de engolir.

Mas já estou tergiversando. O assunto principal é a boa ação. Pois é. A boa ação desta semana poderia ser a seguinte:
- Usar pelo menos uma vez os pronomes possessivos dele ou dela, em vez de seu ou sua. Ou, caso dele ou dela sejam excessivos, substitua seu ou sua pelo artigo definido correspondente.

Exemplos? Tá. Lá vai:

Maria saiu com o seu marido. Marido de quem, cara pálida?
Maria saiu com o marido dela. A frase deixou de ser ambígua, mas ficou redundante.
Maria saiu com o marido. Pronto! Lindo! Divino! Maravilhoso! Maria não corre mais o risco de levar uma surra de alguma esposa traída e fica claro como a água que jorra da fonte que o marido que saiu com Maria foi o dela, e não o da amiga.

Outro exemplo:

She put her hand on her head está claríssimo em inglês, aí chega a turma da tradução e tasca ela pôs a sua mão na sua cabeça. Danou-se! Não é exagero! Juro que a turma do decalque só traduz assim! Ela botou a mão na cabeça estaria tão claro quanto no inglês, não é mesmo? Está claro que a mão era dela! Se não fosse dela, aí seria obrigatório dizer de quem era. O artigo definido expressa exatamente a idéia de que o objeto pertence à pessoa de quem se fala. Em português fluente a gente diz que João quebrou a perna, e não que João quebrou a sua perna. Esse sua é um corpo estranho ali, dá a impressão de que a perna é de outra pessoa, e não do João, pois se fosse dele mesmo, bastaria dizer João quebrou a perna. Ambas as frases estão gramaticalmente perfeitas, mas não é só de gramática que se faz uma língua!

Como diriam os anglos: it's the style, stupid!

E quando devemos trocar seu e sua por dele e dela? Também é para desfazer a ambigüidade. Por exemplo: his book pode ser seu livro, mas fica ambíguo; melhor é dizer livro dele, não é mesmo? Por exemplo: This is his book. Este livro é dele, e não Este é o seu livro, concordam?

Vamos preservar a vida de dele, dela, deles, delas? Usem um dele, dela, deles, delas pelo menos uma vez por semana no lugar desse cacoete horroroso de só usar seu e sua. Que tal? Não dói!

O uso do artigo definido em substituição ao pronome possessivo é uma característica singular da língua portuguesa e sempre foi praticado sem necessidade de curso de especialização. O excesso de traduções e, em conseqüência disso, a escassez de tradutores competentes, levou ao uso indiscriminado do decalque. Em inglês, o uso de my, your, his, her, their etc. é massificado, mas as características da língua o exigem. Os falantes de inglês morrem de inveja desses recursos lindos que a língua portuguesa oferece, dessa riqueza sintática que só as línguas românicas têm, mas os falantes das línguas românicas, por não ter o mapa da mina, acabam invejando a falta de recursos do inglês, que exige a repetição incessante de pronomes, pessoais e possessivos, justamente por não contar com as desinências das pessoas verbais e com o artigo definido para designar o que é próprio da pessoa que fala ou de quem se fala.

Vamos traduzir, minha gente, mas, por favor, não vamos desfigurar o português!

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18.6.07




O maldito POR - Parte II

O texto abaixo é de autoria de uma pessoa por quem tenho enorme respeito profissional. Por motivos particulares ela me pediu que omitisse o nome dela e o da professora e eu vou omitir também o nome do colégio. Pedi permissão para publicar aqui este texto dela porque é mais uma confirmação da macaquice gritante do "por" antes do nome do autor. Também é de 1999.


"Vou contar um caso para provar que esse "por" não faz mesmo parte da tradição da língua portuguesa nesse caso. Sou bastante velha para ter passado por ambas as fases.
Na década de 60 eu estudava no Colégio XXXXXXXXXXX, que era padrão de ensino no Estado. Minha professora de inglês chamava-se XXXXXXXXX, e quem a conheceu pode dizer que ela sabia muuuiito inglês. Mas deu uma mancada, que foi a seguinte. Uma vez passou para a classe um filme sobre cidades inglesas, com seus vários redutos culturais. Lá pelas tantas apareceu uma orquestra dirigida por regente conhecidíssimo meu na época (agora já nem me lembro mais quem era), que tocava a abertura dos Mestres Cantores de Wagner (veja bem, eu disse DE Wagner - alguém diria outra coisa?). A tarefa de casa consistia em narrar em inglês o que havia sido visto. Eu, regateira como sempre, resolvi mostrar erudição e dizer quem era o regente e qual a peça que estava sendo tocada. Foi fácil, eu tinha aquilo em casa, numa gravação americana. Copiei tudo e acrescentei: BY Wagner. Na prova, veio a "correção": "OF" Wagner.
Pois bem, ela seguiu o que o espírito de sua língua materna mandava (= preposição "de"). Na época, a lavagem cerebral ainda não havia começado.
Para mim está claro o seguinte em português:
1. Nome de autores DE artigos sempre vieram sem preposição alguma logo após o título. Mesmo porque QUALQUER preposição ali colocada é redundante, desnecessária, supérflua.
2. Nas frases escritas e faladas ninguém diz que viu um filme POR Steven Spielberg nem que ouviu uma sinfonia POR Mahler. Se estamos falando de DIRETORES e AUTORES, dizemos DE. Isso é indiscutível.
3. Se a preposição "por" se faz necessária é nos seguintes casos: quando o texto foi organizado POR, editado POR, coligido POR, ou qualquer coisa do gênero que precise ser explicitada. Só que, nesse caso, o "por" não aparece sozinho, mas precedido da atividade em questão, como por exemplo: Livro Tal, organizado POR Fulano. Canção tal, gravada por Fulano.
4. Rebatendo o argumento de que antes do "por" estaria implícito um verbo na passiva (do tipo "escrito [por])", eu digo:
- Pois bem, isso seria possível, sim, claro; SÓ QUE a língua portuguesa sempre preferiu deixar implícito um substitantivo (do tipo "da autoria [de])", e não um verbo na passiva. Ou seja, isso faz parte de tradição da língua portuguesa, assim como faz parte da tradição da língua inglesa pressupor um verbo passivo e usar "by". Uma diferença. Incomoda tanto assim? Portanto, é uma questão de uso secular contra um uso que começou a se difundir nos últimos anos de invasão anglófona. ORA, SE É UMA QUESTÃO DE USO E TRADIÇÃO, POR QUE HAVERÍAMOS NÓS DE RESPEITAR A TRADIÇÃO DA LÍNGUA INGLESA, E NÃO A DA NOSSA?
Alguém responde a essa pergunta com argumentos fundamentados?"

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A minha amiga desistiu de esperar pela resposta, mas eu estou esperando até hoje.

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17.5.07




Tudo em excesso mata

Escrevi o texto abaixo em 21 de agosto de 2000. Agora o português esquisito já está em todas as bocas, e não só na escrita. É doloroso ver a sintaxe inglesa se infiltrar e enfear tanto o português.

Quem diz que a dose excessiva de inglês não é letal deve achar bonito abrir o caderno de informática do Estadão e ver:

Cuidados devem ser tomados ao desinstalar programas do Windows.

Tem gosto pra tudo! Pode ser que exista gente aí achando bonito e idiomático o enunciado acima. Pois eu acho um horror! Pelo menos a história de Asterix entre os gauleses é engraçadinha. Já um título de matéria jornalística tão horroroso só dá vontade de fechar o jornal e nunca mais voltar a ler. O jornal é brasileiro e a matéria está na seção "Falha Geral", em resposta à carta de um leitor. Era de se esperar que essa resposta fosse escrita em português, pois não? É por aí que vemos um buraco muito mais embaixo do que o simples zelo pelo léxico e pela gramática. O enunciado acima não tem erro ortográfico nem gramatical. Mas parece o Tarzan falando com a Chita! A frase, ao passar por máquina de tradução, vai redondinha para o inglês, bem certinha e bonitinha.

É claro que preciso admitir que não pode haver lei no mundo que acabe com situações como essa, cada vez mais comuns. Estamos os brasileiros escrevendo em formato de máquina de tradução, remando contra a índole da língua, tudo isso em conseqüência da intoxicação de inglês em todos os veículos de comunicação de massa. O que fazer?

Não sou xenófoba e acho que a influência do jazz foi uma maravilha, pois gerou um filhote chamado bossa-nova, que invadiu o mundo inteiro com o nome original: ninguém conseguiu traduzir. Existem tantas palavras intraduzíveis! O livro "Palavras sem Fronteiras" é um verdadeiro tijolaço! Além disso, pela aberração que vemos acima, que já virou praga, dá para perceber que o problema é muito mais grave do que a simples importação de palavras. Posso muito bem usar uma ou outra
palavra estrangeira e ainda assim falar português (quem aqui não gosta de comer um quibe ou um sushi de vez em quando?). Deixo de falar português quando começo a usar palavras do léxico português e amontoá-las em construções esquisitas, desajeitadas, estranhas.
É exatamente o mesmo que escrever "I like of you". Usei palavras em inglês, não usei?
Mas "I like of you" é inglês?
Gimme a breeeeeak! (Me dá um breque?) Os brasileiros estão escrevendo com sotaque de gringo! Que nome dar a isso? Complexo de inferioridade? Exílio dentro de casa? Burrice?

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